Agora entendo a sua aversão aos dias de
chuva. Eles são realmente catastróficos para o coração. Senti isso hoje, quando
a tarde foi dominada pela água. Com a cabeça encostada no vidro da janela, as
lembranças viam de gota em gota, me desafiando a ser forte. Não quis ter força
alguma naquela hora. Queria era desabar junto com a chuva, despressurizando
minhas neuroses e incongruências. E são tantas dessas. Mas a que mais me
atingia era a nossa neurose e a nossa incongruência, que por sinal é a mais
eterna de todas.
Você nunca errou quando dizia que a chuva
tinha um poder melancólico. Digo mais: ela participa junto conosco da gloriosa
arte de se compreender, mesmo sabendo da impossibilidade de uma conclusão eficaz.
De fato não interessa os concluídos, e sim os perdidos. E a chuva continuava, e
você se revelava naquela tarde como uma presença invisível de olhos, mas
latente de coração. Eu senti seu cheiro, sua pele úmida e sua sinceridade através
do vidro embaçado, e eu agradeci aos deuses da ilusão por ter você mesmo sem te
ter.
A chuva não foi tão má assim como você afirma.
É certo que ela me acertou na tristeza, isso eu não posso negar. Mas se não
existissem as gotas dessa sexta meu encontro contigo não teria sido tão nosso. Eu
fiquei cara a cara com o teu espelho e pude ver que o amor é um grande
sobrevivente.
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