Dispenso definições. Escolho pela metamorfose de escrever livre, longe de qualquer vulto de encaixe. Se me perguntarem sobre o que é isso, hesito em responder. Apenas sinto...

domingo

As vídeolocadoras ainda respiram

O acesso crescente aos downloads virtuais provocou nas vídeolocadoras uma reinvenção estratégica para a sobrevivência na era digital


“Em breve disponível nas locadoras”. Essa frase, que por muito tempo encheu de expectativas as pessoas que abarrotavam as vídeolocadoras, hoje se reveste de um passado distante e esquecido. Com o advento da internet de alta velocidade e o acesso exponencial a downloads de filmes, as locadoras perdem cada vez mais espaço na sociedade e ganham mais espaço apenas na memória dos que faziam desses lugares um reduto de lazer imprescindível. Para resgatar esse tempo nostálgico, as vídeolocadoras estão buscando novas estratégias e até mesmo incorporando inovações tecnológicas para atrair a sua clientela.
A rede de locadoras Game Vídeo, que possui 6 lojas espalhadas pelas cidades de Recife, Jaboatão e Olinda, é um exemplo claro dessa visão estratégica no mercado de hoje. Um dos proprietários da Game Vídeo, Eduardo Montenegro Lemos, admite que a freqüência de clientes diminuiu bastante nos últimos cinco anos, mas existe uma clientela que freqüenta semanalmente o estabelecimento. “Acredito que sempre teremos nossos clientes, porém é necessário que estejamos atualizados e antenados com as novidades e tudo mais que possa fortalecer nosso negócio. Temos que nos profissionalizar e cada vez mais criar produtos e serviços diferenciados”, explica Eduardo. A Game Vídeo investe na diversificação de serviços oferecidos, como a fidelização do cliente através de Cartões de desconto, sorteio de prêmios atrativos como aparelhos de blu-ray, site na internet com o catálogo de filmes e promoções com locações grátis em dias de semana.
Outro ponto estratégico é a relação dos atendentes com o cliente. “O contato com os atendentes é importantíssimo para orientar sobre as escolhas dos filmes. É preciso que esses entendam de filmes e diretores para dar as melhores sugestões”, afirma Alessandro Ísidio, que já trabalhou em algumas vídeolocadoras no Recife. Fora o conhecimento que os funcionários precisam ter sobre cinema, a locadora também é um ambiente que propicia o contato social. O estudante de direito da UFPE, Thiago Leite, ressalta o peso dessa socialização: “O que ainda me atrai ao ir as vídeolocadoras é a interação com outras pessoas, seja com os vendedores ou com os amigos que costumamos encontrar nesses estabelecimentos”, retruca Thiago.
 As locadoras também estão se remodelando em sua função social, se transformando em centros de convivência e conveniência para se aproximar e conquistar os clientes. E para isso criam um ambiente que não só oferece filmes, mas também que imite o espaço físico do cinema, com a venda de guloisemas, pipocas, sorvetes e outros apetrechos atrativos. Além da venda desses produtos, investe-se também na realização de eventos. A Cavídeo, vídeolocadora conceituada na zona sul do Rio de Janeiro, é uma das que inovaram na oferta de atividades ligadas ao cinema. “Tentamos atuar não só na locação, mas em áreas complementares a ela. Temos uma produtora/distribuidora (Cavifilmes), realizamos cineclubes e eventos temáticos. Isso sempre desperta atenção da mídia, e, consequentemente, gera publicidade. Uma vez montamos um telão no estacionamento da Cobal e exibimos filmes a noite inteira. Futuramente vamos fazer uma festa pop-art em um salão de cabeleireiro aqui perto”, expõe Cavi Borges, dono da locadora.
A Classic Vídeo, presente há 25 anos no Recife, sofreu uma queda na quantidade de locações de oito mil para cinco mil locações mensais. Mesmo com esse decréscimo, a locadora possui seu público cativo e a sua estratégia é o imenso acervo de filmes clássicos e de arte. O proprietário da vídeolocadora, Cláudio Brayner, é dono de uma coleção com cerca de 20 mil clássicos, os quais não são geralmente encontrados em locadoras ditas “comuns”. “O movimento caiu muito com o incremento da pirataria e também com os downloads, porém temos uma clientela cativa que nos prestigia há bastante tempo e sempre está à procura de filmes diferenciados e que não consegue no pirateiro nem nos downloads”, explica Cláudio. O público-alvo da Classic Vídeo são geralmente cinéfilos e pessoas mais maduras. Segundo o proprietário, esse tipo de público preza pela qualidade e variedade e os mais velhos ainda não estão familiarizados com os downloads virtuais. “O download nos dias de hoje ainda é bastante lento, só os mais jovens têm paciência suficiente para baixar um filme, que às vezes nem legenda traz, o que não é o nosso caso, que ofertamos qualidade de imagem e som aliado ao diferencial de clássicos e de arte que atrai os cinéfilos e os de meia-idade”, explana o colecionador.
O furor tecnológico, apesar de em parte intimidar a presença das vídeolocadoras, trouxe uma inovação que pode reaquecer esse mercado. Esse fator é a tecnologia Blu-ray, que veio como um substituto da tecnologia DVD, e que, apesar de ainda incipiente no mercado e possuir um custo mais elevado, é positivo para as locadoras. “Você não encontra Blu-ray pirata nas ruas. Essa nova tecnologia, além de melhorar consideravelmente a imagem e som, é mais resistente a riscos e arranhões, a possibilidade de mais extras e curiosidades sobre os filmes, interatividade, entre outras vantagens”, afirma Felipe Rangel, especialista em produção de vídeo. Porém, Felipe considera que o Blu-ray não trará o antigo status das vídeolocadoras, por que, segundo ele, no mercado já existem gravadores de Blu-ray e na internet já começam a ser disponibilizados downloads desse formato, que ainda é bastante tímido se comparado aos de outras tecnologias, como o DVD.
Com toda essa reinvenção das vídeolocadoras, a luta contra a “democracia virtual” de filmes ainda é árdua. E um desses percalços é o preço, um fator que precisa ser reavaliado nesse plano estratégico. Em Recife, um DVD pirata custa, em média, R$ 2, e a locação de filmes varia entre R$ 4 e R$ 8, dependendo da loja. “Um dos grandes estímulos à pirataria e aos downloads é preço. É preciso que as vídeolocadoras abaixem o valor dos aluguéis dos filmes como incentivo para atrair clientes, que estão cada vez mais hipnotizados pelo baixo custo dos piratas e do zero custo dos filmes virtuais”, desabafa Ana Cláudia, freqüentadora de vídeolocadoras e também consumidora de DVD’s piratas. Ana admite que os filmes baixados da internet ou comprados ilegalmente muitas vezes pecam pela qualidade. Muitos desses filmes vêm sem sincronização de legendas, travam no momento da exibição, possuem imagem e som distorcidos e não trazem os extras que os originais apresentam. Apesar de todos esses contras, existem vantagens que prevalecem na hora de sair de casa em busca das vídeolocadoras. “Eu sei que a qualidade às vezes não é essa coisa toda, mas é mais cômodo e econômico baixar filmes em casa. Eu penso até em solicitar entrega a domicilio, mas eles cobram uma taxa que acaba saindo mais caro ainda. Se as locadoras reduzissem todos esses custos estimularia mais os clientes. Muitas já oferecem pedidos on-line, o que já um grande estímulo, pois não preciso sair de casa”, explica a estudante de odontologia, Karen Richers.
Mesmo com todos os esforços dos proprietários das vídeolocadoras para sobreviver aos novos tempos reinados pela liberdade virtual, é preciso admitir uma realidade que já é consagrada: não há como escapar do englobamento trazido pela internet. “Apesar de todas essas estratégias, a internet é poderosa e continuará forte rumo a uma maior democratização cultural, e a saída para o mercado das vídeolocadoras é seguir o velho ditado: se não é possível lutar contra o inimigo, una-se a ele”, conclui a pesquisadora social especialista em tecnologia, Janusy Mara. 


Veja mais:
- Conheça um pouco do acervo diferenciado de filmes clássicos e de arte do colecionador Cláudio Brayner, proprietário da Classic Vídeo, pelo link:

- Saiba quais as promoções que a rede Game Vídeo Locadora disponibiliza em suas lojas através do link:

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